
Parte 1: John Hughes e os Anos 80
2010 foi o ano em que comecei a minha vida definitiva como cinéfilo. Foi ali que assisti uma boa parte dos suspenses de Hitchcock, tive meu primeiro contato com Scorsese, comecei a me interessar por ficções-cientificas toscas dos anos 60/70, descobri porque os roteiros de Woody Allen são tão especiais e assisti praticamente toda a filmografia de Chaplin. Ou seja: Foi naquele período que o meu eu-cinéfilo realmente nasceu. É claro que antes já tido contato com grandes filmes, mas foi apenas ali que comecei a entender porque eles eram tão grandes. E foi também em 2010 que me familiarizei com o nome de John Hughes.
Diferente da maioria dos fãs de Hughes, eu não conheci sua carreira a partir das repetições dentro da programação da Sessão da Tarde, isso não significa que não passei tardes vendo e revendo seus filmes. Curtindo a Vida Adoidado, A Garota de Rosa-Shocking, Gatinhas e Gatões e Mulher Nota Mil são comédias que além de extremamente atuais e eficientes (e mesmo eu não sendo um fã deste último, tenho que admitir sua relevância), apresentam as características que marcaram as principais obras da época. Afinal, basta conhecer alguns dos filmes mais icônicos dos anos 80 para apontar os temas que se voltam, basicamente, para as dificuldades de ser incompreendido.
Os Garotos Perdidos, Os Goonies, Conta Comigo, Quero ser Grande e Sem Licença para Dirigir são filmes que, mesmo tendo elementos narrativos e objetivos diferentes, tentam entender a cabeça de um adolescente, seja a partir de uma aventura surreal ou de situações mais corriqueiras. O melhor exemplo é o clássico E.T. - O Extraterrestre, que usa da excelente estratégia de mostrar os rostos dos personagens adultos apenas quando estes são extremamente essenciais para o desenrolar da trama, optando por observar - e contar - tudo a partir do ponto de vista dos personagens mirins.
E é agora que, finalmente, chego em Clube dos Cinco, aquele que, na minha opinião, é a obra-prima de John Hughes que sintetiza o que foi o cinema nos anos 80. E é uma pena que minha primeira visita ao filme tenha sido um bocado decepcionante: Incomodei-me com o ritmo, o excesso de diálogos e com a forma clichê com que os personagens eram desenvolvidos. E não tenho a menor vergonha de admitir que todos esses problemas não estavam dentro do filme, mas sim em mim.
A história, que gira em torno de cinco estudantes que são obrigados a cumprir detenção no sábado à tarde, é apenas um pretexto para fazer uma profunda e complexa análise social. Não é à toa que Clube dos Cinco dificilmente seria feito ou conhecido hoje em dia. Ainda que tenhamos filmes como o clássico-moderno Meninas Malvadas, o ótimo A Mentira e até o recente The DUFF, que tentam (e até certo ponto, conseguem) subverter clichês e fazer alguma espécie de comentário social, a ideia de se fazer um drama - disfarçado de comédia adolescente - apoiado inteiramente em diálogos existenciais e desenvolvimento de personagens, seria barrada, amputada pelo estúdio ou não seria vista. E não duvido que haja uma porção de filmes atuais que tenham os mesmos princípios de Clube dos Cinco, mas é impossível encontrá-los a disposição (tanto que aquele que considero o melhor filme adolescente dessa geração, The Myth of the American Sleepover, seja conhecido por apenas um grupo minúsculo de pessoas).

Analisado de uma forma "convencional"The Breakfast Clubé impecável: Todo o elenco está muitíssimo bom, o roteiro é recheado de diálogos afiados e complexos, a direção consegue cumprir a tarefa de desenvolver, de forma fluída e dinâmica, uma história que se passa em um local intensamente delimitado e a trilha sonora é marcante. Mas este é o tipo de filme que não deve ser visto de uma forma convencional.
Logo, por ter sido feito exatamente na metade da década, Clube dos Cinco pode servir como ponto de referência de praticamente todos os filmes teens dos anos 80. E não fico nenhum pouco surpreso ao notar que a maioria dos filmes da época que contam com personagens rasos são praticamente esquecidos hoje em dia.
Um exemplo perfeito é Namorada de Aluguel (Can't buy me Love, 1987): O filme conta a história do personagem interpretado por Patrick Dempsey, um nerd e excluído que compra por um mês a imagem de ser namorado da garota mais popular do colégio. O roteiro é clichê e previsível, mas seu maior problema é a forma absurdamente infantil e idiota como trata seus personagens. De acordo com os realizadores, os adolescentes americanos da época são o que os estereótipos dizem: pessoas vazias, cujas motivações envolvem dinheiro ou popularidade, e basta oferecer algum deles para ter o controle absoluto de suas mentes. Eles são aquilo que os adultos veem deles: Pessoas que pensam que podem acrescentar muito ao mundo, mas que na verdade são protótipos de pessoas inteligentes.
E é aí que reside a beleza de Clube dos Cinco: seus personagens estão além de qualquer barreira criada por padrões sociais. Eles não são desenvolvidos a partir da visão de produtores de Hollywood ou de roteiristas e diretores que apenas visam o lucro, eles são analisados por eles mesmos (tanto que John Hughesé conhecido como o "adolescente que nunca cresceu"). Ao colocar todos esses estereótipos juntos em um lugar só, a desconstrução ocorre a partir do brutal confronto entre eles.
Aliás, a ideia de que todos os personagens construíram camadas para se adaptar na sociedade com o intuito de esconder seus sentimentos "reais" não é apenas interessante do ponto de vista narrativo, como também é profundamente honesta. Quem nunca mentiu, pelo menos um pouco, apenas para se encaixar dentro de um grupo ou fazer parte de uma conversa? E Hughes não julga quem o faz. Essa é a diferença entre os integrantes do Clube dos Cinco e os outros tantos personagens de comédias adolescentes: Eles podem ser facilmente rotulados como delinquentes, vazios, estudantes que não conhecem a vida, mas o filme vai além e dá um rótulo muito mais profundo do que estes: o de seres-humanos.
Por isso, pode ser doloroso chegar à conclusão de que essas camadas tão artificiais são impostas pela mesma sociedade que as julga. E é igualmente doloroso ter que assistir as camadas - que, de uma forma ou de outra, servem como defesa emocional - sendo lentamente postas à prova. Tanto que os melhores momentos do filme são aqueles em que todos estão sem nenhuma espécie de proteção (o icônico círculo perto da escada é, em minha opinião, um dos momentos mais importantes da história do cinema).
Porém, quando vi ao filme pela primeira vez - analisando-o de forma obviamente apressada, não houve espaço para enxergar a verdadeira mensagem que o filme queria passar. Eu apenas consegui enxergar os clichês: O nerd, a menina popular, a estranha, o jogador de futebol e o drogado. Dentro da minha cabeça limitada da época eles eram apenas isso, quando na verdade podem ser vistos como uma representação de nós mesmos. Todos nós (a idade pouco importa) já tivemos problemas em se comunicar com os pais, com rótulos, em fazer amigos, em manter determinada reputação. Ou seja: todos nós já tivemos problemas.
O que nos leva ao final de Clube dos Cinco: Ao admitir que a ideia de que aqueles cinco personagens pudessem realmente ser amigos fora da detenção é uma fantasia, Hughes encerra a trama da forma mais honesta possível. A amizade entre eles acabou no minuto em que deixaram o colégio no sábado. Na segunda-feira eles voltariam a ser o nerd, a menina popular, a estranha, o jogador de futebol e o drogado. O importante é que eles e nós descobrimos que somos muito mais do que isso.
Texto Escrito por: Gabriel Pinheiro
Revisão de Texto por: Kamila Wozniak
Revisão de Texto por: Kamila Wozniak
FICHA TÉCNICA
Nome Original: The Breakfast Club (1985)
Duração: 1h 37min.
Roteiro: John Hughes.
Produção: John Hughes.
Direção: John Hughes.
Elenco: Emilio Estevez, Anthony Michael Hall, Paul Gleason, Judd Nelson, Molly Ringwald, John Hughes e Ally Sheedy.
Duração: 1h 37min.
Roteiro: John Hughes.
Produção: John Hughes.
Direção: John Hughes.
Elenco: Emilio Estevez, Anthony Michael Hall, Paul Gleason, Judd Nelson, Molly Ringwald, John Hughes e Ally Sheedy.
SINOPSE
Em virtude de terem cometido pequenos delitos, cinco adolescentes são confinados no colégio em um sábado, com a tarefa de escrever uma redação de mil palavras sobre o que pensam de si mesmos. Apesar de serem pessoas completamente diferentes, enquanto o dia transcorre eles passam a aceitar uns aos outros, fazem várias confissões e tornam-se amigos.