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Crítica: BoJack Horseman | 2ª temporada

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“I’m not perfect. I’m cynical and I’m possessive. And I can sometimes fly off the handle.  I’m not always the best at being no terrible”.

No início, pode parecer difícil aceitar e abraçar  BoJack Horseman.  O visual soa simplista demais, o humor desfocado (é complicado entender quem é realmente seu público alvo) e o protagonista um narcisista babaca. Porém, com o passar dos episódios, é impossível não mergulhar completamente nas maluquices da série e seu universo.

Depois de entender onde os criadores do programa estavam querendo ir, se entende também as decisões por eles tomadas e chega a ser surpreendente analisar suas primeiras impressões sobre a série e notar o quão equivocadas e preconceituosas eram. Sim, o design de produção continua simplista, o tom cômico continua um mistério e BoJack continua como um personagem moralmente falho. A diferença é que todas essas características, aos poucos, deixam de ser problemas e passam a ser particularidades únicas (ainda que bizarras).

A primeira temporada fez o público – que persistiu na narrativa – passar por essa transformação: enquanto o personagem-título passava por uma profunda autodescoberta, enquanto sua autobiografia era escrita, estávamos nos acostumando em passar horas dentro de um universo onde animais antropomorfizados vivem normalmente na sociedade. E mesmo com excelentes personagens coadjuvantes, os doze primeiros episódios se preocupavam mais em desenvolver BoJack e sua relação com Diane (e consigo mesmo, é claro). Essa segunda temporada, no entanto, consegue desenvolver uma narrativa que, mesmo não abandonando os problemas existenciais de seu personagem-título, dá um espaço maior para seus coadjuvantes e para as relações entre eles. 

E mesmo sendo hilária, madura e extremamente original, a galeria de personagens é a melhor coisa dentro de BoJack Horseman. A maioria deles são extremamente narcisistas e egoístas, outros são apenas personagens problemáticos e disfuncionais. Em outras palavras, é difícil encontrar alguém inteiramente justo, bem-intencionado ou irrepreensível dentro do universo proposto. E por mais incrível que isso pareça, é um excelente sinal. Afinal, é a prova do quão complexos e multifacetados são aqueles personagens. BoJack é o perfeito exemplo disso: essa é uma pessoa (ou melhor, cavalo) que no fundo é boa. A verdade é que ele apenas adaptou sua personalidade ao ambiente em que vive. Seus princípios e sua benevolência foram, de certa forma, sacrificados para atingir seus objetivos na vida em Hollywood (e o décimo primeiro episódio desta temporada explora com perfeição esse aspecto). Em outras palavras, BoJack pode ser encarado sim como um panaca egocêntrico, mas talvez a forma mais correta de vê-lo é como alguém que simplesmente fez decisões erradas, pensando mais em sua imagem do que em sua felicidade. E o impacto ruim que tem às pessoas à sua volta acaba criando um círculo vicioso de autodestruição e depressão.

Mas BoJack não é a única figura interessante na narrativa. Diane, por exemplo, é alguém que surge no primeiro momento como uma espécie de bússola moral. Por isso, chegar à conclusão de que só a vemos assim porque aqueles ao seu redor são ainda mais frágeis e desprezíveis, é um conceito profundamente maduro que a série apresenta. E a relação da personagem com Mr. Peanutbutter – que sofre por significantes reviravoltas no decorrer desta temporada – é um elemento que traz à tona todas as suas camadas mais profundas (e falhas). Todd, por outro lado, pode ser visto como o personagem mais moralmente correto e ajustado (mesmo levando em consideração o fato de que vive no sofá de BoJack). E talvez seja por sua ingenuidade/pureza que Todd é constantemente ignorado e ridicularizado pelos amigos. E se Princess Caroline continua uma personagem adorável, incrivelmente energética e tão problemática quanto o restante do grupo (neste caso, é impossível não notar  as proporções imensas que sua profissão tem em sua vida), a adição de Wanda é mais do que bem vinda. 

E ainda que a construção de personagens seja o principal atrativo de BoJack Horseman, o lado cômico da série também é admirável. O roteiro insiste nas ótimas piadas que brincam com a espécie dos personagens (há um momento em que um dos personagens solta um“precisamos conversar sobre o elefante na sala” e acaba ofendendo um elefante que realmente estava na sala) e que compõe a principal fonte de humor no programa. Mas a verdade é que, no geral, é impossível prever de onde ou como uma piada pode surgir: Há brincadeiras com os elementos que compõe Hollywood (uma recorrente com Drew Barrymoreé, particularmente, memorável), há piadas que funcionam por conta da repetição (uma envolvendo com um cabo no chão do set de filmagem do filme Secretariat funciona puramente por seguir o clássico padrão de ‘pista e recompensa’) e há aquelas que são apenas jogos de palavras (por isso, assista no áudio original. Vi algumas cenas com a dublagem em português e maior parte das piadas se perdem completamente).

Além disso, mesmo parecendo boba e infantil em uma primeira passada de olhos, a série é profundamente adulta. É claro que é possível entreter crianças com as gags visuais (mesmo não sendo recomendável), mas alguns dos momentos mais engraçados ou inventivos da narrativa são extremamente sutis e complexos. Ao longo desses doze episódios, BoJack Horseman falou sobre o controle da mídia sobre a opinião pública, sobre o quão reprovável são os atos de abatedores de animais, sobre nossa dependência absoluta de tecnologia e sobre a (má) qualidade de programas de televisão atuais (a lista é imensa, acredite se quiser), ao mesmo tempo que usa de sutileza para brincar com assuntos um pouco mais “pesados” (em determinado momento, Wanda – que acabou de despertar de um longo coma – diz‘eu não faço sexo há vinte anos. Ou pelo menos eu espero’).

Contando com um elenco de vozes simplesmente sensacional (mais um motivo para ver a série em seu áudio original),  BoJack Horseman  cresceu nesse segundo ano. Mesmo não tendo um arco tão nítido e organizado quanto a primeira (o que não é necessariamente ruim), esta segunda temporada é engraçada,  nonsense e madura. E diferente do que a primeira impressão pode passar, este é ótimo estudo de personagem (um dos mais criativos e eficientes entre as séries atuais, na minha opinião). E dizer isso sobre uma série animada envolvendo animais falantes é mais que surpreendente, é um deleite.
Nota Final ★ ★ ★ ★ (Excelente)
Texto Escrito por Gabriel Pinheiro
Revisão Textual por Bruna Campos
FICHA TÉCNICA
Lançamento: 2015.
Episódios(s): 12 capítulos.
Gênero: Comédia e Animação
Duração: 25 min. por episódio
Elenco (vozes): Will Arnett, Aaron Paul, Amy Sedaris, Alison Brie e Paul F. Tompkins.
Criador (es): Raphael Bob-Waksberg.

SINOPSE
BoJack (Will Arnett) é um decadente cavalo que trabalha na TV. Uma estrela já esquecida de um seriado da década de 1990 chamado Horsin' Around, ele disfarça sua baixa auto-estima com uísque e relações fracassadas. Com a ajuda de Todd (Aaron Paul), seu parceiro humano, e a ex-amante Princesa Caroline (Amy Sedaris), ele quer deixar novamente a sua marca no mundo do entretenimento. 

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